sábado, 28 de dezembro de 2019

[0205] Diversidades e sínteses no «Azulejo»


O caminho que o azulejo tem feito em Portugal iniciou-se nos finais do século XV. Nos mais de quinhentos anos que entretanto decorreram, sucederam-se e coexistiram diversas escolhas quanto à sua tipologia (padrão; figuração; ornamentação), às suas cores (múltiplas; azul e branco; única), às suas formas (além da quadrada, também a triangular, a hexagonal, a semi-circular, a redonda, a estrelada) e à sua superfície visível (plana; ou com um relevo mais ou menos acentuado).
Para obter uma descrição do estado desta arte, foram inquiridos quarenta e nove portugueses e estrangeiros a ela ligados (investigadores, arquitectos, artistas, designers, antiquários, gestores de património, colecionadores), cujos breves testemunhos proporcionaram uma visão ampla das múltiplas facetas sob as quais pode ser encarada: a histórica, a patrimonial, a iconográfica, a estética, a material, a técnica, a funcional, a arqueológica, a etimológica, a política, a social, a antropológica, a afectiva …


Capa de livro

Alguns desses testemunhos trouxeram a debate tópicos particularmente desafiadores:

Islão:
“O zellige é um tipo de decoração geométrica que consiste em dispor lado a lado ladrilhos de terracota de diferentes cores e tamanhos, de acordo com regras geométricas precisas.” Trata-se de uma técnica para formar padrões, herdeiro de um método árabe muito antigo, o tastir, que determinava como distribuir espacialmente as diferentes formas geométricas. Este método, bem como um outro ainda mais antigo, o hasba, ainda hoje são usados em Marrocos.
Investigador Rachid Benslimane

Cerâmicas:
“Os azulejos pertencem à grande família das cerâmicas utilizadas na arquitectura, como os tijolos, a terracota, a faiança e o mosaico.”
Investigador Hans Van Lemmen

Ladrilhos:
Em “Portugal fez-se muita «azulejaria» anterior ao século XV, mas dávamos-lhe outro nome: ladrilho.”
“A «azulejaria» iniciou o seu percurso em Alcobaça, na Abadia de Santa Maria, durante a transição do século XIII para o XIV. Nessa época, os tais magníficos ladrilhos embelezavam a igreja em tons de branco e turquesa e desde então nunca mais deixaram de ser utilizados.”
Investigador Rui André Alves Trindade

Protagonistas:
“O azulejo e a sua obra têm vários protagonistas: o oleiro, o pintor, o ladrilhador, o encomendador, constituindo sempre um processo artístico integrado e articulado.”
Professora Maria Alexandra Trindade Gago da Câmara

Conjugações:
“O azulejo é um objecto de barro vidrado relacionado com o acto extraordinário e arcaico de conjugar num só artefacto os quatro elementos – TERRA, FOGO, ÁGUA e AR -, e que, simultaneamente, através do revestimento modular, se vincula ao ESPAÇO.”
Arquitectas Catarina e Rita Almada Negreiros

Património:
“Imaginem o que significaria remover toda a azulejaria da arquitectura portuguesa dos passados cinco séculos.”
Leonor Sá, coordenadora do Projecto «SOS Azulejo»

Fonte: livro de Silva e Carvalho (2018; pp. 6-9, 14, 26, 34, 90, 100 e 102)

sábado, 21 de dezembro de 2019

[0204] A espiral do tempo e a árvore de Natal


As Férias do Natal constituíam, no tempo em que fui professor, a primeira grande interrupção do ano lectivo. Eram quase duas semanas de liberdade mental, acontecendo-me frequentemente usá-la para explorar … problemas de Matemática. O mesmo me acontecia, aliás, nas Férias de Verão, como referi na mensagem «0056».

Agora a minha liberdade mental é outra, mas parece que o Natal continua a inspirar-me na direcção da Matemática, como se nota nas últimas mensagens.

Em Setúbal, na Avenida Luísa Todi, está agora patente a seguinte estilização de uma árvore de Natal, com a forma de um cone de revolução, salientando-se sobre ela uma curva que se vai enrolando, ou desenrolando, ao longo da superfície cónica:


Esta curva é uma espiral, um conceito matemático assim definido num dicionário especializado: “Curva que é desenhada por um ponto que se move em torno de um ponto fixo, do qual se afasta gradualmente.

Para nos certificarmos de que se trata de uma espiral, e não de uma outra curva, podemos observar os detalhes da construção desta árvore de Natal a partir de uma fotografia tirada do solo:


Conclui-se que este tronco de cone é formado por 18 segmentos de recta, que descem do vértice até ao solo, e por um número indefinido de circunferências horizontais, todas com centro no eixo do cone e apoiadas nos segmentos de recta.
No entanto, isto não é exactamente o tronco de um cone de revolução, mas sim uma superfície parecida, constituída por sucessivos andares formados por trapézios. E a curva mais não é do que uma sucessão de diagonais dos trapézios: terá ela a forma aproximada de uma espiral?

Desenhando toda esta construção como uma projecção horizontal, e reduzindo-a a um número mais fácil de desenhar de segmentos de recta, apenas 16, e a 10 circunferências, temos de facto uma aproximação à espiral tal como é definida na Matemática (é constante a relação entre o ritmo com que roda e o ritmo com que se afasta, ou aproxima):


Há, na Natureza, diversos fenómenos dependentes do tempo a que os respectivos especialistas associam a espiral:

Um deles é a forma de uma boa parte das galáxias, como a da Galáxia de Pinwheel (também conhecida por «Messier 101 or NGC 5457»), situada a uma distância de aproximadamente 21 milhões de anos-luz do Sistema Solar:


Outro é o da forma de crescimento das Amonites, um grupo de moluscos que viveu entre meados do Devónico e o fim do Cretácico (durante mais de 300 milhões de anos), e que é parente dos actuais nautiloides:


Voltando à oportunidade que as interrupções de trabalho nos proporcionam: nas últimas duas décadas e meia os sucessivas equipas que ocuparam o Ministério da Educação promoveram a redução dos tempos de paragem, tanto para alunos como para professores, o que tem implicado a expansão do tempo em que, uns e outros, estão sujeitos a controlo por uma hierarquia, diminuindo assim o tempo disponível para a criatividade individual. Onde está aqui a sociedade inovadora que tanto é apregoada?

Fotografias: Eva Maria Blum (Setúbal) e Wikipédia (Galáxia; Amonite)
Desenho: Pedro Esteves
Fonte: livros de Albuquerque & Carvalho (1990; p. 51) e de Pappas (1989; p. 189)

quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

[0203] Na seguinte narrativa, baseada em imagens, onde está o erro?


Na mensagem anterior chamei a atenção para a necessidade de não confiarmos nas aparências demonstrativas das imagens.

Eis um caso em que as imagens nos enganam:


Pois!

O problema não se encontra nos dois hexágonos côncavos: os seus ângulos internos são iguais ou a 90º ou a 270º, sendo fácil verificar que o modo como eles se encaixam não deixa espaços livres nem provoca sobreposições

Acontecerá o mesmo com os triângulos?! Não, não acontece!
Para que o triângulo verde e o triângulo vermelho ajudem a formar o triângulo grande, as suas hipotenusas têm de estar igualmente inclinadas – e não estão!
Olhando para as hipotenusas como estradas que vamos subir (da esquerda para a direita), a do triângulo verde precisa de avançar horizontalmente cinco quadradinhos para subir dois: a sua subida tem a inclinação 2 em 5, ou 40 %. E a hipotenusa do triângulo vermelho precisa de avançar horizontalmente oito quadradinhos para subir três: a sua subida tem a inclinação 3 em 8, ou 37,5 %. Elas têm quase a mesma inclinação, mas não a mesma.
Por sua vez, a hipotenusa do imaginado triângulo grande deveria ter a inclinação 5 em 13, ou seja, aproximadamente, 38,5 %.
Não há duas inclinações iguais!

Para mostrar o que acontece nas imagens acima podemos exagerar um pouco a inclinação das hipotenusas:


A soma da área em falta na primeira imagem e da área em excesso na segunda imagem é igual à área do quadradinho que faz a diferença …

sábado, 7 de dezembro de 2019

[0202] Narrativas com imagens: os impulsos e os factos


Segundo o psicólogo e pedagogo Jerome Bruner [ver mensagem «0003»], há dois modos genéricos para os seres humanos organizarem o seu conhecimento do mundo e a sua experiência mais imediata. A um desses modos, que “parece mais especializado para tratar de «coisas» físicas”, chamamos pensamento lógico-científico, pois é utilizado “mediante a verificação ou a prova”. Ao outro, mais apto para tratar das pessoas e das suas obrigações”, chamamos pensamento narrativo, pois é julgado “com base na verosimilhança ou na sua afinidade com a vida.”

Dada a importância que a «imagem» tem hoje em dia, muitas das nossas narrativas são apoiadas em fotografias, em desenhos, em organigramas ou em qualquer outra imagem tanto nos que serve para chamar a atenção como para facilitar a compreensão do que pretendemos narrar. Por exemplo, uma das demonstrações mais estéticas do Teorema de Pitágoras pode ser descrita através das seguintes imagens e palavras:


Esta descrição, apesar do seu título, «demonstração», não decorre de um «pensamento lógico-científico»: para tal falta, por exemplo, verificar se os quatro quadriláteros compõem correctamente o quadrado de lado A. Limitando-se a estas imagens e palavras trata-se, apenas, de uma narrativa interessante, que bate certo com aquilo que já conhecemos acerca do Teorema de Pitágoras.

Diferente é a plausibilidade do que se narra através da imagem com que comecei a mensagem anterior [«0201»]:


Se há quem ache esta imagem tradutora da «evolução da educação», esse não é o meu caso, pelo que, em vez de a colocar como primeira e principal imagem da mensagem, a deveria ter colocado depois de descrever o que «observei nas últimas décadas nas escolas». As narrativas também podem ser controladas, mediante outras narrativas que apresentem maior fundamentação factual.

Fonte: livro de Bruner (2000)

terça-feira, 3 de dezembro de 2019

[0201] Trabalhar a «memória», para ver as «escolas» muito para além do que «parecem»


Há uma velha piada acerca da suposta degradação do nosso ensino de que de vez em quando surge uma nova versão. Talvez se trate apenas de uma piada persistente; mas também pode ser um espetar de alfinetes no boneco que representa um problema que não se compreende.
A última versão que conheço dessa piada (e que, como muitas das anteriores, espeta os alfinetes no ensino da Matemática) é a seguinte:


Uma piada é uma piada. E tentar espantar os males através de alfinetes não faz mais do que tentar espantar os males através de alfinetes. Por isso, interessa antes pensar o que nunca é esclarecido: o que se tem afinal passado no nosso ensino e que nos pode isso dizer sobre o que está nas nossas mãos fazer ou exigir?

Em muita opinião, o ensino atravessou, no último século, três grandes fases. E como em nenhuma delas se verificou uma uniformidade de pensamentos e de acções, a sua caracterização só pode ser feita a partir das influências que dominaram em cada uma.

A primeira fase estendeu-se até algures na década de 1960.

Para quem nesses anos mandava no país, não era problemático que a escolaridade média fosse muito baixa, havendo, inclusive, uma enorme percentagem de pessoas analfabetas. O ensino para além da 4ª classe destinava-se a uma minoria e, mesmo para ela, apenas se pretendia que memorizasse. Vergílio Ferreira, num dos seus romances, descreveu assim o modo como então se aprendia:

Nós somos crianças até muito tarde, Mónica, a gente só muito tarde é que faz ideia da quantidade de coisas que engoliu sem mastigar. Uma voracidade assim, a gente engolia tudo, as coisas não eram para pensar, mastigar, era só para engolir.
- Abre a boca!
E a gente abria. Ser criança é ter muitos deuses à volta, a gente não discute e está-se bem a terem eles a autoridade. Tudo quanto me ensinaram era indiscutível como haver coisas. A gente não discutia, que significado tinha discutir? Era o mesmo que discutirmos a tabuada.

Um problema de Matemática que me lembro de ter pela frente nesses anos era o das torneiras, que pode ser enunciado assim:


Temos duas torneiras e um tanque com água. A primeira torneira, se a outra estiver fechada, enche o tanque em 10 minutos; e a segunda, com a primeira fechada, enche-o em 15 minutos. Abertas em simultâneo, em quanto tempo enchem elas o tanque?

Só consegui resolver este problema por mim próprio quando já era adulto. Naquela altura, quem mandava no ensino apenas pretendia que memorizássemos os modos de resolução. Eu não o consegui.

A segunda fase decorreu até meados da década de 1990.

Ainda não tinha chegado o 25 de Abril e um pouco por todo o lado surgiram grupos de professores a querer fazer coisas diferentes; foi nesse contexto de insatisfação docente que surgiu uma reforma da Matemática, sob a orientação do matemático Sebastião e Silva, e uma outra, do ensino em geral, lançada pelo ministro Veiga Simão.
A seguir a 1974 o número de professores que quiseram prosseguir estas mudanças aumentou, ao mesmo tempo que os sucessivos governos abriam as escolas, tendencialmente, a todos os jovens.

Muitos alunos iniciavam os estudos sem usufruir de qualquer tradição escolar na sua família, e eram confrontados nas escolas com ferramentas que os professores mais ousados lhes traziam para os ajudar a aprender. Uma dessas ferramentas eram umas peças triangulares, quadrangulares e pentagonais, com arestas iguais e que se podiam encaixar umas nas outras. Era possível formar com elas os mais diversos poliedros:


Os alunos que nunca tinham possuído brinquedos parecidos com estas peças em casa passavam a primeira aula a construir com elas figuras que inventavam. Era necessário deixá-los acalmar do choque de encontrar algo tão interessante e que desconheciam: se eu fosse aluno durante estes anos, também gostaria de ter uma hora para explorar a meu gosto estas peças.
Mas nas aulas seguintes já era possível passar para outros desafios. Por exemplo: contar o número de faces, o número de arestas e o número de vértices destes poliedros e tirar daí conclusões.
Procedendo assim, pretendia-se que os jovens tivessem a possibilidade de experimentar, de pensar, de conjecturar, de argumentar, de debater. A memorização passava a ter um lugar mais discreto.

A terceira fase dura até hoje; e, infelizmente, promete continuar por mais uns tempos.

Já tinha sido bom que o sucesso escolar obtido na fase anterior tivesse melhorado em relação ao verificado antes da década de 1960, em particular porque o acesso à escola era agora incomparavelmente superior. Mas queria-se sucesso para todos - e ainda bem.
No entanto, a melhoria pretendida tem vindo a ser apropriada e padronizada por um número crescente de intervenientes exteriores às escolas: gestores das Organizações Internacionais e do Ministério da Educação, especialistas das Universidades, técnicos de grandes Empresas de material didáctico, das Fundações e, agora, até das Câmaras Municipais. Tudo está tremendamente regulamentado nas escolas.

Os temas têm de se referir, a torto e a direito, à «sustentabilidade»; os professores têm de obedecer às «boas práticas», que não são as suas; todos os alunos devem ser «incluídos», o que quase sempre quer dizer que se devem adaptar à cultura dominante, pois não há tempo para conhecer as suas próprias culturas.
Talvez seja exactamente isso que a velha piada nos quer dizer, sem o conseguir explicitar: à medida que a ânsia por resultados (o sucesso) se instala entre os gestores, os especialistas e os técnicos, tudo o que podia ajudar a lá chegar (a complexidade do mundo; a generosidade e a experiência dos professores; a variedade pessoal e cultural dos alunos) é posto de lado para não complicar

Fonte: livro de Pacheco, de onde provém a citação de Vergílio Ferreira (1996; p. 223)

domingo, 24 de novembro de 2019

[0200] A propósito dos Faróis: a que distância, no Mar, se começa a avistar Terra?

Supondo que a Terra é perfeitamente redonda (e de raio r), que o Observador se encontra ao nível do mar e que aquilo que ele vai observar (por exemplo um Farol) está situado a uma altura h acima do nível do mar:



Aplicando a este esquema o Teorema de Pitágoras vem d2 + r2 = (r + h)2, o que conduz à seguinte solução positiva para a distância d:




Se h e r forem expressos em metros, d também virá expresso em metros.

O matemático Franco de Oliveira simplificou esta fórmula, considerando um valor aproximado para r = 6 500 km e desprezando h2 (por ser muito pequeno em relação a 2hr), obtendo:




em que h está expresso em metros e d em quilómetros.

Este é só o início do problema (e portanto da resolução).
Podemos pretender não a distância entre o Observador e o Farol, mas a distância mais curta que a Embarcação em que se supõe estar o Observador irá percorrer até atingir a base do Farol (será a distância geodésica g). Para isso será necessário calcular o ângulo a (a partir de d / r = tangente de a) e depois o tamanho do arco da geodésica que lhe corresponde.

Podemos querer que o Observador não se encontre ao nível do mar, mas mais acima (no convés da Embarcação, ou no antigo Cesto de Gávea), e então o esquema em que se basearão as deduções e os cálculos será mais complexo:




Que resulta da aplicação da fórmula de Franco de Oliveira ao caso do Farol do Cabo Espichel, tal como referido na mensagem «0199»?
O topo da sua torre óptica está situado a 32 metros, a que se deve acrescer os 136 metros que a falésia tem nesse local. Total = 168 metros.
Então, segundo a fórmula, o Farol será visto a, aproximadamente, a raiz quadrada de 13 x 168, ou seja, usando uma máquina de calcular simples (com os quadradinhos a indicarem as teclas ou grupos de teclas):


… e o ecrã mostra 46,7 (quilómetros, claro).

Muito próximo dos 48 quilómetros que nos informam no próprio Farol ser o seu alcance.

Fonte: artigo, em revista, de Oliveira (1988)

segunda-feira, 18 de novembro de 2019

[0199] Um farol é um ponto de uma rede de faróis


O Farol do Cabo Espichel situa-se no Sudoeste da Península de Setúbal, um dos locais com registos mais antigos sobre a existência de luzes destinadas a avisar os navegantes. Tal como hoje o conhecemos, este farol foi construído em 1790, tendo sofrido várias reformulações ao longo dos séculos XIX e XX:

Fotografia de Eva Maria Blum (2009)

A sua torre óptica é hexagonal e tem 32 metros de altura. Até 1883 a luz que emitia era fixa e branca, alcançando as 13 milhas marítimas. Actualmente emite luz branca, com «característica» de 4 segundos (0,3 segundos para a «luz» e 3,7 segundos para a «ocultação»), tendo o alcance duplicado (26 milhas marítimas, quase 48 quilómetros).

A grande visibilidade histórica proporcionada por este farol resulta de a base da sua torre óptica se encontrar 136 metros acima do nível do mar; e o seu recente aumento resultou da evolução tecnológica na produção da luz, que lhe aumentou a intensidade (que é inversa ao quadrado da distância).
Apesar de o seu funcionamento ter sido automatizado, este farol ainda precisa de 3 faroleiros residentes, que, de 4 em 4 meses, mudam.

O posicionamento geográfico e a visibilidade de cada farol são articulados com o posicionamento e a visibilidade dos outros faróis, de modo a que uma embarcação, observando as «característica» de vários faróis próximos, possa identificar o seu posicionamento no mar. No Farol do Cabo Espichel está patente ao público que o visita uma Carta da Costa de Portugal, datada de 1927, em que a rede de faróis dessa época mostra o apoio que estes prestavam à navegação:

Fotografia de Eva Maria Blum (2014)

Fontes: artigos jornalísticos de Silva (2005) e de Santana (2008); e visita em 26 de Julho de 2014, no âmbito do programa Ciência Viva no Verão

sábado, 9 de novembro de 2019

[0198] Em que dia da semana aconteceu?


No topo da primeira página da edição de 25 de Abril de 1974 do «Diário de Lisboa», em letras muito pequenas, pode ler-se que este dia correspondeu a uma 5ª feira:


Nesse dia, bem cedo, com metade da semana já passada, todos se preparavam para mais uma jornada de trabalho. Talvez começassem a desejar que o fim-de-semana chegasse e os deixasse com todo o tempo livre. Mas o que aconteceu nesse dia abriu-lhes o caminho da liberdade para muito mais do que o fim-de-semana, tendo sido assim noticiado à tarde:


Terá este dia sido escolhido pelo «Movimento das Forças Armadas» de modo a que as pessoas pudessem sentir e participar na abertura libertadora que lhes era proporcionada?
Tivesse ou não havido essa intenção, é de supor haver muitas outras e importantes razões para escolher um dia como este. Então, por curiosidade, em que dias terão acontecido outras mudanças radicais como esta como o 5 de Outubro de 1910 e o 28 de Maio de 1926?

Theoni Pappas divulgou, num dos seus livros, um algoritmo que permite determinar em que dia da semana a que ocorreram todas as datas dos séculos XIX, XX e XXI. Para o utilizar, são necessárias três tabelas:


As regras a seguir na determinação do dia da semana, aplicadas às três datas referidas, são as seguintes:


Se se vier a confirmar que esta amostra não corresponde a uma excepção, é de admitir que os dias da semana são os preferidos para dar início às grandes mudanças!
Mãos ao trabalho!

Fontes: para o «Diário de Lisboa», o sítio da Casa Comum; e para o algoritmo, o livro de Pappas (1991; p. 159)

quarta-feira, 6 de novembro de 2019

[0197] Porque não diminui mais radicalmente o nosso insucesso escolar?


Segundo o Ministério da Educação, as nossas escolas retiveram, no final de 2017-18, cerca de 50 mil alunos no Ensino Básico e outros 50 mil no Ensino Secundário. Trata-se de um insucesso escolar muito elevado, apesar de estes números terem sido notoriamente reduzidos em relação aos de há alguns anos atrás.

O nosso insucesso escolar é, segundo uma especialista ouvida pelo jornal «Público»:
massivo”, dado ser um dos mais altos entre os países membros na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico);
selectivo”, pois afecta, sobretudo, alunos provenientes de famílias com baixas qualificações escolares, com piores condições económicas e/ou envolvidas em movimentos migratórios;
precoce”, por se verificar desde os primeiros anos de escolaridade; e
cumulativo”, na medida em que os alunos que são retidos uma vez têm tendência a voltar a ser retidos.

O Ministério da Educação não se tem poupado no lançamento de medidas de combate a este insucesso. Só na última década, implementou a Autonomia e Flexibilidade Curricular e o Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar, reforçou a Acção Social Escolar e o Desporto Escolar, desafiou uma mão cheia de Agrupamentos de Escolas a integrar, durante três anos, o Projecto-Piloto de Inovação Pedagógica (“dando-lhes mais liberdade para delinear currículos, organizar turmas, estabelecer horários”) e lançou o Apoio Tutorial Específico (destinado aos alunos do 2º e do 3º Ciclos que acumulavam duas ou mais retenções).

Mas não foi apenas o Ministério da Educação a querer estar envolvido neste combate. Um número considerável de instituições financeiramente poderosas têm vindo a formular os seus próprios projectos e a propor apoio às escolas que a eles aderirem: casos, por exemplo, da Fundação Calouste Gulbenkian e da Fundação Francisco Manuel dos Santos.

Referindo-se aos seus projectos, o Ministro da Educação salientou, recentemente, “que o princípio base destas estratégias é o envolvimento de cada comunidade na construção de soluções mais participadas e mais adequadas ao seu contexto.” O que todos os outros promotores de projectos para que as escolas resolvam o problema do insucesso escolar também se têm apressado a salientar, em relação às suas próprias iniciativas.

É com esta profunda auto-indulgência que o Estado e os Privados têm encarado a Educação nas últimas décadas: estando convencidos de serem quem sabe o que é necessário fazer, concedem às comunidades, às escolas, aos professores e aos alunos a oportunidade de se envolverem e de participarem no que, prévia e superiormente, decidiram por eles. E, pensado assim, e agindo em conformidade, não põem em causa as mais profundas razões para o insucesso escolar:
·      a Uniformidade dos Currículos, pois a flexibilidade curricular apenas permite a implementação do mesmo currículo, de modo a ser avaliado pelo mesmo exame; ela não autoriza a construção de currículos radicalmente diferentes, baseados, por exemplo, nas expressões e nas solidariedades; temos um currículo predominantemente racionalista, e essa é uma das origens do nosso insucesso escolar;
·      o Poder Absoluto dos Directores: num inquérito feito a 25 mil professores pela Federação Nacional de Professores, 93 % não concordaram com a manutenção do actual modelo de gestão das escolas, porque ele concede a uma única pessoa a possibilidade de decidir acerca de quase tudo – que envolvimento e que participação das escolas podem resultar deste controlo dos docentes?
·      o Silêncio das Outras Culturas: as famílias com baixas qualificações escolares, com piores condições económicas e/ou envolvidas em movimentos migratórios também têm uma cultura e, se por vezes não sabem ler, também têm voz para contar o que sabem; aprender a ler e criar hábitos de leitura é importante, é sempre importante, mas é ainda mais importante fazê-lo para se poder afirmar; tal como testemunhou o actor e dramaturgo Ivam Cabral (na mensagem «0193»), “Eu sou filho de uma costureira e de um pedreiro analfabeto que tiveram seis filhos. Éramos muito pobres, vivíamos no interior do país. Mas tudo o que o Ivam não precisava enquanto criança e adolescente era ser incluído. Precisava de acesso a bons livros, a boas escolas, a cultura. Há uma diferença muito grande entre inclusão e acessibilidade. A inclusão contrapõe-se à exclusão. E isso é terrível. Quando se inclui alguém, em geral, apenas se inclui. A acessibilidade dá acesso ao ir e vir. A acessibilidade está numa linha horizontal. Eu dou a possibilidade de alguém conhecer a minha cultura e o que penso, mas quero também conhecer o que ele pensa. Um português que emigrou para Paris nos anos 1970 teve de ser incluído, porque o parisiense não queria saber da cultura dele. Não havia troca. Raramente assimilamos a cultura de alguém que tentamos incluir.

Com esta falta de questionamento, o insucesso escolar pode ir diminuindo … mas tão devagar … e tão tristemente!

Fontes: artigos jornalísticos de Pereira (2019) e de Silva (2019); e entrevistas a Cabral, por Pinto (2019), e a Rodrigues, por Pereira (2019)

segunda-feira, 28 de outubro de 2019

[0196] Uma estratégia flexível para a Educação para a Cidadania


Especialmente nas duas últimas décadas tem sido proposto que a Educação para a Cidadania desempenhe um papel central nas nossas escolas. Para o concretizar, no entanto, tanto se tem exagerado por excesso (criando-lhe referenciais muito detalhados), como por defeito (deixando cada professor entregue a si próprio).
Se, por exemplo, adoptarmos como referência, de forma muito aberta, os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável que as Nações Unidas propuseram aos governos e aos cidadãos do mundo cumprir entre 2015 e 2030, a Educação para a Cidadania corresponderia a pensarmos como responsáveis globais, a valorizarmos o esforço que as grandes organizações internacionais têm feito para nos chamarem a atenção para isso e, porque somos nós que estamos em contacto directo com os problemas, a dispormos do nosso direito à interpretação crítica daqueles objectivos.

Neste blogue, os dezassete Objectivos do Desenvolvimento Sustentável foram até agora genericamente apresentados na mensagem «0080», tendo os primeiros sido referidos nas mensagens «0154» (erradicar a pobreza), «0157» (erradicar a fome), «0169» (saúde de qualidade), «0176» (educação de qualidade) e «0178» (igualdade de género).
Uma estratégia de abordagem é a da recorrência: abordar cada um, ou mais do que um, mais aprofundadamente ou mais ligeiramente, conforme as oportunidades que se aproveitam ou se criam.

Tendo o Dia Mundial para a Erradicação da Pobreza Extrema ocorrido há dias, em 17 de Outubro, é altura de dar uma nova vista de olhos pelo primeiro dos Objectivos do Desenvolvimento Sustentável, erradicar a pobreza. Esta data começou a ser comemorada em 1992 e este objectivo foi depois escolhido como um dos oito Objectivos do Milénio, que as Nações Unidas definiram para serem implementados entre 2000 e 2015 (portanto imediatamente antes dos Objectivos do Desenvolvimento Sustentável).

Em Portugal, segundo os dados da Rede Europeia Anti-Pobreza, 18 % dos portugueses são pobres, uma condição que se aplica a quem, na Europa, tenha um vencimento mensal inferior a 406 euros.
No mundo, 43 % da população vivia em pobreza extrema em 1990, com menos de 1,25 dólares por dia. Entretanto esta percentagem diminuiu para 21%, mas há ainda muito trabalho pela frente, especialmente no continente africano.

Também há dias, o Prémio Nobel da Economia referente a 2019foi atribuído a Abhijit Banerjee, Esther Duflo e Michael Kremer, pelos seus contributos para as políticas que visam reduzir a pobreza:

Da esquerda para a direita: Abhijit Banerjee, Esther Duflo e Michael Kremer

Entre as fortes razões para a atribuição deste prémio, foram salientados os casos das mais de 700 milhões de pessoas que ainda vivem com rendas extremamente baixas, das perto de cinco milhões de crianças menores de cinco anos que morrem anualmente devido a doenças que poderiam ser prevenidas ou curadas com tratamentos não dispendiosos e das cerca de uma em cada duas crianças que abandonam todos os anos a escola apenas com capacidades básicas de leitura e aritmética.

Fontes: sítios do Calendarr Portugal e do El Pais Brasil

quarta-feira, 23 de outubro de 2019

[0195] Uma ave invulgar: o Charneco


Estes Charnecos foram fotografados há poucos dias quando se mostravam muito interessados na comida que se compra nos supermercados para dar aos Gatos:

Fotografia de Adelaide Silva

Estes bonitos pássaros fazem parte da família dos Corvídeos, onde estão incluídas as Pegas, as Gralhas, e também os Corvos, os Gaios e os Quebra-Nozes. São aves de dimensão média ou grande, com patas e bicos fortes, sempre atentas, muito sociais e que aprendem depressa. Sendo omnívoras, não admira que procurem experimentar as novidades alimentares que estejam ao seu alcance … (deixando, como testemunhou a fotógrafa deste grupo de Charnecos, alguns membros do grupo a vigiar).

O Charneco (cujo nome científico é Cyanopica cyanus) tem cerca de 31 a 35 centímetros de comprimento, incluindo a cauda, sendo bastante parecido com a Pega (Pica pica), que é um pouco maior e quase exclusivamente preta e branca.

Na Europa, os Charnecos são residentes exclusivos da Península Ibérica:


Os Charnecos fazem os seus ninhos nas copas das árvores. E fora da época da reprodução deslocam-se alegremente em grupo.

Fonte: livro de Svensson & outros (2014; pp. 360-361)

terça-feira, 15 de outubro de 2019

[0194] A corrida dos 10 mil metros e os limites do nosso corpo


A queniana Brigid Kosgei obteve antes-de-ontem, em Chicago, uma nova melhor marca mundial feminina na Maratona: 2 horas, 14 minutos e 4 segundos.
A melhor marca masculina é de Eliud Kipchogue, também queniano, e foi obtida em 2018, em Berlim: 2 horas 1 minuto e 39 segundos.
Há mais de 12 minutos de diferença entre estas duas marcas mas, há quase um século, quando estes registos começaram a ser feitos e reconhecidos, a diferença era bem maior.

A Maratona corre-se pelas ruas e estradas, ao longo de 42, 195 quilómetros, condições que se inspiram numa lenda da Grécia Antiga: o soldado Fidipídes terá corrido aproximadamente esta distância, entre o campo de batalha de Maratona e Atenas, para anunciar aos seus compatriotas que os atenienses tinham vencido os persas, morrendo de seguida, exausto.

A Maratona para Homens foi incluída em todos os Jogos Olímpicos modernos (a sua primeira edição foi realizada na Grécia, em 1896), tendo a sua extensão variado ligeiramente até ser fixada em 1924 (nos Jogos Olímpicos de Paris). Mas as Senhoras só começaram a disputar esta prova nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 1984, embora já corressem esta distância fora das Olimpíadas desde há décadas.

As mais antigas melhores marcas mundiais reconhecidas pela International Association of Athletics Federation (IAAF) são a do norte-americano Johnny Haynes, em 1908 (2 horas 55 minutos e 18 segundos), e a da britânica Violet Pierc, em 1926 (3 horas 49 minutos e 22 segundos). Até hoje, já se verificaram 41 registos de melhores marcas para os Homens e 34 para as Senhoras. E evolução desses registos é visível nos seguintes gráficos (faltando registar no segundo a marca conseguida antes-de-ontem por Brigid Kosgei):

HOMENS

MULHERES

Há uma grande diversidade de questões que podem ser colocadas a estas informações, as quais podem ser a base para o desenvolvimento de projectos interdisciplinares com alunos:

Como se explicam os constantes progressos da «melhor marca» de cada prova?
Em particular, quais são os aspectos fisiológicos e sociológicos dessa evolução?
Haverá uma «melhor-marca-limite» para cada prova?
Como nasceram e se desenvolveram historicamente as diferentes competições desportivas individuais?
Que ferramentas matemáticas se pode usar para descrever e modelar (e também para prever) a evolução de cada «melhor marca»?

Outras mensagens que abordaram este tema: «0068» (corrida dos 100 metros, masculina) e «0102» (natação dos 100 metros, masculina)

Fontes: livro de Guillén (1987; p. 37) e sítio da Wikipédia (versão em inglês)

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

[0193] Uma mesa na cidade


O actor e dramaturgo Ivam Cabral explicou assim o modo como lhe surgiu a ideia de que é possível intervir nas cidades:

A minha relação com o espaço urbano veio da minha relação com Lisboa, onde vivia. Quando procurámos um espaço para trabalhar encontrámos o Teatro Ibérico, que ficava no sítio onde depois se construiu a Expo 98. Em 1993 era um lugar muito distante, muito escuro, onde não havia comércio nem luz à noite. O nosso trabalho era acender a luz que ficava à frente do teatro. Por causa disso, quem estava perto ou passava interessava-se por aquilo que estava a acontecer. Era como se ao acender aquelas luzes chamássemos as pessoas. A partir daí, o acender a luz de algum lugar passou a ser um gesto político.

Depois, explicou como usou essa ideia para intervir na Praça Roosevelt, um dos lugares mais perigosos de São Paulo, com muitos problemas com furto, alguns assassinatos, uma presença muito forte do tráfico:

Quando procurámos um lugar para nos instalarmos, queríamos mesmo um espaço escuro e problemático. Queríamos executar essa ideia que trazíamos de Lisboa de que a grande revolução é uma mesa na rua. Foi o que aconteceu. Colocámos uma mesa em frente ao nosso espaço e enquanto estávamos ali sentados nenhum problema acontecia naquele lugar. Quando tomamos a cidade para nós, afastamos a criminalidade. Porque ela acontece, em geral, no escuro. Quando jogamos uma luz sobre a cidade estamos a chamar as pessoas para a conversa. E nós começamos a chamar os traficantes, as pessoas que estavam por ali ...

Num primeiro momento tinham muito medo. Depois, quando percebiam que era um lugar seguro, um lugar iluminado, ficaram. Ao trazer cidadãos que estavam a traficar, em geral menores de idade, para dentro de portas começámos a dar-lhes um nome, um mote para a vida. Passavam a ser alguém. Muitos foram trabalhar connosco, na técnica, operando som e luz, na limpeza do espaço. Havia muitos travestis e prostitutas e chamamos vários para conversar e trabalhar. Alguns tornaram-se importantes na equipa.
Um deles foi o Emerson Fernandes. Tinha 17 anos. Um dia chamámo-lo para fazer um pequeno serviço no nosso teatro, criámos uma ponte. Ele acabou por sair das ruas e hoje é funcionário da Escola de Teatro, casado, pai de dois filhos. Transformou-se num dos técnicos mais importantes do teatro de São Paulo. A grande mudança deu-se através do encontro com o teatro. Hoje ele tem uma vida que os irmãos dele, que não encontraram a arte, não têm.

Esse trabalho começou a ser conhecido e um dia o presidente da câmara de São Paulo, José Serra, veio visitar Os Satyros, a nossa companhia de teatro. Pediu para pensarmos numa escola profissional e técnica de teatro. Surgiu dessa encomenda do poder público. O projecto pedagógico da escola construiu-se do encontro de vários artistas. Não tínhamos, no início, nenhum pedagogo. Mas tínhamos uma frase: «Em que escola gostaria de ter estudado?» Fomos respondendo a essas perguntas e criando um sistema pedagógico que quebra com o ensino formal. Trabalhamos com a experiência. Ensinamos aprendendo e aprendemos ensinando.



E explicou porque distingue, nestas intervenções, a «inclusão» da «acessibilidade»:

Eu sou filho de uma costureira e de um pedreiro analfabeto que tiveram seis filhos. Éramos muito pobres, vivíamos no interior do país. Mas tudo o que o Ivam não precisava enquanto criança e adolescente era ser incluído. Precisava de acesso a bons livros, a boas escolas, a cultura. Há uma diferença muito grande entre inclusão e acessibilidade. A inclusão contrapõe-se à exclusão. E isso é terrível. Quando se inclui alguém, em geral, apenas se inclui. A acessibilidade dá acesso ao ir e vir.
A acessibilidade está numa linha horizontal. Eu dou a possibilidade de alguém conhecer a minha cultura e o que penso, mas quero também conhecer o que ele pensa. Um português que emigrou para Paris nos anos 1970 teve de ser incluído, porque o parisiense não queria saber da cultura dele. Não havia troca. Raramente assimilamos a cultura de alguém que tentamos incluir.

Fonte: Cabral, entrevistado por Pinto (2019)

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

[0192] Professor: em quem vai votar?


Esta pergunta não é de modo algum absurda numa escola: hoje os jovens estão muito mais próximos do mundo dos adultos e querem compreendê-lo, diversificando as fontes de informação e de opinião que acham serem credíveis.
No entanto, como os adultos sabem, também o modo como as perguntas lhes são colocadas pelos jovens devem ser encaradas como tentativas de conversar sobre assuntos que eles estão à procura de saber formular.


Uma possível conversa, a partir de uma pergunta tão frontal:

·      votar é um dos actos da democracia, mas não é o único, nem é o central;
·      o que é central na democracia é a participação dos cidadãos, individualmente e em grupo;
·      os enormes desafios que hoje se colocam a todos nós exigem que estejamos atentos ao que se situa para além dos espaços que habitualmente percorremos, ao que aconteceu antes e ao que acontecerá depois do  tempo em que estamos a viver e a todos aqueles com quem não estamos em contacto directo;
·      a educação é um dos meios que nos pode ajudar a alargar estes horizontes.