quarta-feira, 14 de junho de 2017

[0048] A terrível verdade da guerra

Os relevos de Lachish são o 21º objecto descrito em «Uma História do Mundo em 100 Objetos» por Neil MacGregor, director do Museu Britânico. Foram encontrados no palácio do rei Senaqueribe, em Nínive (perto da actual Mossul), tendo sido esculpidos entre 700 e 692 a. C.. Por essa altura o império assírio estendia-se desde o Irão ao Egipto, cobrindo quase todo o território a que hoje se chama Médio Oriente.
Lachish (actualmente Tell ed-Duweir) era então a segunda cidade do reino da Judeia, a seguir a Jerusalém, situada no ponto crucial onde o Mediterrâneo e o Egipto se ligavam à Mesopotâmia. Nos finais do século VIII a. C., Ezequias, o seu rei, rebelou-se contra os assírios. E Senaqueribe invadiu-lhe o reino, conquistando a cidade de Lachish.

Este painel, em baixo-relevo, tem cerca de 2,5 metros de altura e estaria situado a toda a volta de uma sala do palácio de Senaqueribe, em Nínive, provavelmente pintado a cores. Nele se conta, como num filme épico, a marcha do exército assírio, as lutas resultantes do cerco de Lachish, a sangrenta conquista da cidade, a fuga dos sobreviventes, a cidade em chamas, o desfile dos prisioneiros, Senaqueribe triunfante …


Consciente do persistente paralelismo histórico deste episódio, MacGregor pediu um testemunho a Lorde Ashdown, longamente experiente no custo humano da guerra, especialmente pelo seu trabalho nos Balcãs:

Vi campos de refugiados por todos os Balcãs e, francamente, nunca consegui evitar que as lágrimas me viessem aos olhos, porque o que via era a minha irmã, a minha mãe, a minha mulher e os meus filhos. Vi sérvios expulsos por bósnios, e bósnios expulsos por croatas, croatas expulsos por sérvios e por aí adiante. Vi ainda o mais infame de tudo, os refugiados ciganos, um grande campo de refugiados, talvez 40 a 50 mil, a cargo do meu exército, a NATO. E ficámos a olhar enquanto as suas casas eram queimadas e eles eram expulsos dos seus lares. E isso fez-me sentir não só desesperadamente triste, mas também envergonhado. O que é verdade, e o relevo [de Lachish] mostra, é, em certo sentido, o carácter imutável e inalterável da guerra. Há sempre guerras, há sempre mortes, há sempre refugiados. Os refugiados são uma espécie de destroços e carga deitada ao mar. São abandonados quando a guerra termina.

Fonte bibliográfica: MacGregor (2014; pp. 143-146)

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