Apesar de já ter acontecido há muito tempo, lembro-me bem da
estimulante actividade mental desencadeada pela leitura, algures, de uma
comparação proporcional entre os momentos em que ocorreram alguns dos
acontecimentos marcantes da Vida da Terra e os momentos de Um Dia.
Não era mais do que um modelo. A Matemática necessária para
a sua construção era apenas uma ferramenta auxiliar. O essencial era o modo
como se chamava a atenção para a lentidão dos processos geológicos e biológicos
e, sobretudo, para a recentíssima (e portanto frágil) incorporação da
humanidade nesse processo.
Como construir um modelo destes?
Em primeiro lugar, precisamos de conhecer qual a duração da Vida da Terra: 4 600 Ma (milhões de anos).
E precisamos de a reduzir a 24
horas, ou seja, a 24 x 60 x 60 segundos = 86 400 segundos.
Se os 4 600 Ma estão a ser
comprimidos em 86 400 segundos, cada milhão de anos comprimido equivalerá,
aproximadamente, a 18,78 segundos.
Este é o factor de conversão. Que,
aplicado à conversão inversa, também nos diz que cada segundo de Um Dia
equivalerá a um pouco mais de … 53 mil anos da Vida da Terra!
Em segundo lugar, precisamos
de escolher alguns acontecimentos que sejam chave, pois adivinhamos que o
leitor gosta de sentir que estão a falar daquilo que ele conhece e que lhe é
caro. Uma hipótese é a seguinte:
·
Surgimento das
primeiras células (ainda simples, comparadas com as de hoje): terá
ocorrido há mais de 3 800 Ma – esta datação, tal como algumas das que
se seguem, está sujeita a revisões resultantes de novas descobertas e dos
respectivos debates;
·
Início da maior
explosão e diversificação da vida (de acordo com o registo fóssil):
ocorreu no início do Câmbrico, primeiro
período da era Paleozoica, há 542 Ma;
·
Surgimento das
árvores modernas (com um caule organizado em anéis concêntricos, cada
qual correspondendo a um ano): a Archaeopteris
é considerada a pioneira, surgida em meados da era
Paleozóica, há 370 Ma; precedeu o Ginkgo e as Coníferas e deu origem a todas as árvores actuais (com
excepção das Palmeiras e dos Fetos, que ainda trabalham como outrora);
·
Surgimento das
plantas com flor (a evolução anterior trouxera as sementes): as primeiras
flores seriam parecidas com as das actuais Magnólias e terão surgido na segunda metade da era Mesozoica, há uns 160 Ma;
vieram estabelecer fortes relações de simbiose com os insectos e com as aves;
·
Choque do meteorito
que quase extinguiu a vida na Terra (os dinossáurios deixaram de ser o
grupo dominante, apenas deixando como vestígio um seu ramo especial, que
evoluiu para as aves que hoje conhecemos): ocorreu há 65,5 Ma,
correspondendo à transição da era Mesozoica
para a Cenozoica;
·
Surgimento dos
primatas superiores: a partir de primatas mais pequenos, evoluíram na
floresta tropical africana, desde há uns 35 Ma, estando na origem do homem e dos primatas
superiores mais recentes;
·
Surgimento do Homo sapiens: há cerca de 150 mil
anos, talvez um pouco mais.
Por fim,
precisamos de transformar os milhões de anos da Vida da Terra no seu
equivalente em Um Dia e de apresentar convincentemente o resultado.
Uma primeira divisão, desenhada aproximadamente, em Pré-câmbrico
e Fanerozoico (incluindo este o Paleozoico, o Mesozoico e o Cenozoico):
E uma segunda divisão, mais conhecida (pela abundância de
fósseis), a do Fanerozoico, em eras:
Fontes bibliográficas: Atkins (2007; pp. 43 e 59); Carvalho (2007; p. 23); Coppens,
entrevistado por Simonnet (2006; p. 101); Hublin & Seytre (2009; p. 17,
cladograma da evolução do Homem); Pelt, entrevistado por Girardon (2000; pp. 40,
54 e 60-61)
Fontes na internet: sítio da International Stratigraphic Chart (consultado em 2007); Museu
Nacional de História Natural (imagem da Terra em fusão); Wikipédia (imagem das
trilobites)
Fonte jornalística: Serafim (2017; imagem da primeira flor, de Hervé Sauquet & Jürg
Schönenberger)
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