“A literatura não é apenas uma fonte maravilhosa de prazer. Cumpre, além disso, uma função social e histórica de primeira ordem que é a de desenvolver nos leitores um espírito crítico. Depois de termos lido uma grande obra literária, um grande romance, um grande poema, um ensaio, regressamos ao mundo real convencidos de que a realidade está mal feita, que está muito aquém daquela ficção que somos capazes de inventar através da fantasia e da palavra. Isso faz-nos olhar para a nossa envolvência social, cultural e política com olhos muito críticos. E creio que essa é a razão pela qual a literatura, ao longo de toda a História, foi sempre vista com muita desconfiança e com muito temor pelos governos autoritários, pelas ditaduras, por todos os regimes que, no fundo, tratam de controlar a vida e querem demonstrar aos cidadãos que o mundo está bem feito. É essa a razão da censura. E efectivamente a literatura é um perigo para esse tipo de regimes porque tem sempre uma atitude muito crítica face ao mundo tal como ele é.”
“O problema é que a literatura hoje em dia vive uma crise
muito profunda, converteu-se sobretudo em entretenimento, perdeu a sua
pugnacidade, a sua beligerância crítica, e busca sobretudo entreter. E o entretimento
também é uma espécie de adormecimento, uma maneira de desmobilizar criticamente
os cidadãos. Creio que essa crise da cultura, que é muito profunda na minha
opinião, pode ter um efeito gravíssimo na vigência da democracia e da
liberdade. Pela primeira vez na história, o pesadelo de [George] Orwell, de uma
ditadura tecnológica, com um absoluto controlo sobre a vida das pessoas, um
mundo de cidadãos convertidos em autómatos, já é possível. Isso acontece por
causa da degradação da cultura no nosso tempo.”
Fonte: Llosa (2014)
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