domingo, 30 de julho de 2017

[0061] Três famílias de padrões geométricos que encontramos nas cidades

As seguintes transformações geométricas planas conservam as formas e as dimensões das figuras às quais se aplicam, sendo por isso designadas por isometrias:


Os padrões geométricos planos com que nos deparamos nas cidades podem ser identificados e classificados usando estas três isometrias:



Exemplos de moldes de madeira usados para fazer a calçada portuguesa:

   Com rotação («rosácea») e com reflexão 


   Sem rotação, mas com reflexão

Se a aplicação destes moldes se repete, por translação, ao longo de uma rua, gera um «friso»; se se repete, por dupla translação, no plano de uma praça, gera um «papel de parede».
O mesmo se dirá de um azulejo que se repita numa só ou em duas direcções.

Fonte bibliográfica (da qual adaptei a fundamentação e, sobretudo, o fluxograma): Silva (2017)
Fotografias: Eva Maria Blum (em 23 de Julho de 2017, na exposição «Debaixo dos Nossos Pés», em Lisboa)

quarta-feira, 26 de julho de 2017

[0060] A «Groma», instrumento romano para traçar linhas rectas e linhas perpendiculares

Como terão começado a ser traçadas as linhas rectas e as linhas perpendiculares na construção das casas, das ruas, dos monumentos e das cidades?

Certamente terão sido inventadas várias técnicas. Os romanos usaram a Groma (palavra da qual deriva a agrimensura), um suporte vertical com cinco prumos de bronze, pendentes de um suporte em cruz, como se mostra na seguinte peça, idealizada e realizada por Marco Calado, Rui Inácio, Carlos Loureiro e Fernando Manteigas (e mostrada no Museu do Teatro Romano, em Lisboa), e de que o desenho junto sugere uma utilização:


Alinhar visualmente três fios de prumo garantia a sua linearidade: e como se garantiria que o outro alinhamento de três fios lhe era perpendicular?

Imagens: respetivamente, Pedro Esteves (23 de Julho de 2017, no Torreão Poente da Praça do Comércio) e Eva Maria Blum (6 de Fevereiro de 2016, no Museu do Teatro Romano), em Lisboa

sábado, 22 de julho de 2017

[0059] Realidade, imagem, mistério: René Magritte

Escreveu René Magritte, pintor, belga (1898-1967):

A minha pintura são imagens visíveis que não escondem nada; elas evocam o mistério. O mistério também não significa nada, é incognoscível.

«La clef des champs / A Porta para a Liberdade» é uma das suas obras, datada de 1933 (e que se encontra no Museo Thyssen-Bornemisza, em Madrid):


Pretende-se sugerir a existência da liberdade para além da janela?
É ela uma ilusão fomentada pelas imagens que a representam?
Ou a uma pintura cria uma realidade com outras regras?

Fonte bibliográfica: Klingsöhr-Leroy (2005; pp. 62-65)
Fonte da imagem: www.wikiart.org/en (acedida em 22 de Maio de 2017)

quinta-feira, 20 de julho de 2017

[0058] «Eu Não Sou o Teu Negro»: se não conhecemos o outro, não mudamos

Quando algo está mal e precisa de ser mudado, poderá essa mudança acontecer sem que primeiro conheçamos os outros com quem vamos mudar?

Esta é uma das perguntas feitas por James Baldwin, intelectual negro americano, ao reflectir, entre 1979 e 1987, sobre as vicissitudes dos negros na sociedade norte-americana.

Cartaz do filme

I`m Not Your Negro: documentário que Raoul Peck concluiu em 2016, baseado em «Remember This House», um esboço de 30 páginas de James Baldwin

sábado, 15 de julho de 2017

[0057] Boaventura de Sousa Santos: o desequilíbrio entre «regulação» e «emancipação

Boaventura de Sousa Santos chamou a atenção para que a complexidade do paradigma da modernidade tem sido distorcida a favor de um dos seus pilares, o da «regulação».

Na minha opinião, a educação, pressionada pela opinião social dominante, tem sido uma das formas de induzir os cidadãos mais novos nessa distorção.













Para aqueles que o quiserem possam pensar, aqui vão alguns excertos da posição deste empenhado sociólogo:

O paradigma sócio-cultural da modernidade surgiu entre o século XVI e os finais do século XVIII, antes de o capitalismo industrial se ter tornado dominante nos actuais países centrais. A partir daí, os dois processos convergiram e entrecruzaram-se, mas, apesar disso, as condições e a dinâmica do desenvolvimento de cada um mantiveram-se separadas e relativamente autónomas.

O paradigma da modernidade é muito rico e complexo, tão susceptível de variações profundas como de desenvolvimentos contraditórios. Assenta em dois pilares, o da regulação e o da emancipação, cada um constituído por três princípios ou lógicas.

Pilar da regulação:
o “princípio do Estado, formulado essencialmente por Hobbes”, “consiste na obrigação política vertical entre cidadãos e Estado”;
o “princípio do mercado, desenvolvido sobretudo por Locke e por Adam Smith”, “consiste na obrigação política horizontal individualista e antagónica entre os parceiros de mercado”;
o “princípio da comunidade, que domina toda a teoria social e política de Rousseau”, “consiste na obrigação política horizontal solidária entre membros da comunidade e entre associações”.

Pilar da emancipação, “constituído pelas três lógicas de racionalidade definidas por Weber”:
a racionalidade estético-expressiva das artes e da literatura”;
a racionalidade cognitivo-instrumental da ciência e da técnica”;
a racionalidade moral-prática da ética e do direito”.

Desde o início que se previra a possibilidade de virem a surgir excessos e défices, mas tanto uns como outros foram concebidos de forma reconstrutiva (...). Essa gestão reconstrutiva dos excessos e dos défices foi progressivamente confiada à ciência e, de forma subordinada, embora também determinante, ao direito. Promovida pela rápida conversão da ciência em força produtiva, os critérios científicos de eficiência e eficácia logo se tornaram hegemónicos, ao ponto de colonizarem gradualmente os critérios racionais das outras lógicas emancipatórias.

Fonte bibliográfica: Santos (2002; pp. 46-48)
Fonte da imagem: blogue «Esencial o Menos» (de Juan José Guirado)

quarta-feira, 12 de julho de 2017

[0056] A criatividade que surge com a moleza de Verão …

Uma das memórias mais fortes que tenho dos tempos em que estive activo como professor diz respeito à disponibilidade da minha mente durante as férias de Verão: era um tempo em que não havia um dia de ontem, nem de hoje, e sobretudo amanhã não era dia. Estava com a mente completamente livre. E por isso me surgiam as mais diversas questões e hipóteses sobre o que me rodeava, que ia anotando num dos blocos de notas que sempre me acompanharam. E, mais tarde, à medida que me interessava pelo que tinha anotado, enfrentava galhardamente alguns dos desafios que me tinha colocado … e ia perdendo a memória sobre os restantes.
Agora isso não me acontece (tanto, nem especialmente no Verão), porque a minha actividade é mais homogénea ao longo de todo o ano.

Na mensagem «0046» figurava o seguinte problema, colocado no papiro de Rhind, escrito há mais de 3 500 anos: “Em sete casas há sete gatos. Cada gato apanha sete ratos. Se cada rato comer sete espigas, e se cada espiga semeada produzir sete alqueires, qual é a soma total?

Este texto tem cinco frases, surgindo nas três interiores a palavra “cada”; admito então (não estando de modo nenhum certo disso) que na primeira frase, “Em sete casas há sete gatos”, não se quis dizer “Em cada uma de sete casas há sete gatos”.

Então, para o(s) autor(es) deste texto, cada gato seria faraó numa casa (tal como hoje):


Se cada (cada um dos 7) gato(s) apanhava 7 ratos, teríamos 7 x 7 ratos apanhados.
Se cada rato comia 7 espigas, teríamos 7 x 7 x 7 espigas comidas.
Se cada espiga produzia 7 alqueires, a produção seria de 7 x 7 x 7 x 7 alqueires.

Mas que quereria(m) o(s) autor(es) dizer com “soma total”?
Uma hipótese: ele(s) referir-se-ia(m)-se aos “alqueires”. Então a resposta seria 7 x 7 x 7 x 7 (ou 74).
E outra hipótese: ele(s) quereria(m) somar todos aqueles números, para chatear todos os egípcios que tentassem resolver ao problema. Então a resposta seria:
(7) + (7 x 7) + (7 x 7 x 7) + (7 x 7 x 7 x 7)
Como ainda não havia exames obrigatórios no final de cada ciclo de escolaridade, duvido que fosse esta a solução esperada.
E se houvesse, talvez no papiro com as soluções viesse escrito:
(7 + 73) x (1 + 7).

Imagem não identificada: estátua de gato, em bronze, do Egipto Antigo

sábado, 8 de julho de 2017

[0055] A exposição «Pedras que Jogam»

A exposição «Pedras que Jogam», apresentada publicamente em 2004, veio lembrar-nos uma das vias populares pela qual os jogos se difundiram e praticaram.

O catálogo desta exposição, já referida na mensagem «0037», está acessível a partir da página «Outros documentos» deste blogue, onde também há acesso a outros ficheiros sobre «jogos de reflexão»:


A imagem da capa deste catálogo mostra-nos um tabuleiro do jogo Alquerque dos Doze (que será motivo de uma próxima mensagem).

Autoria do catálogo: Departamento de Matemática da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa & Museu da Cidade da Câmara Municipal de Lisboa (2004)

quarta-feira, 5 de julho de 2017

[0054] Séneca, um político e um filósofo contemporâneo de Cristo

Escreveu Séneca, numa das suas cartas a Lucílio:

Se a sabedoria só me for concedida na condição de a guardar para mim, sem a compartilhar, então rejeitá-la-ei: nenhum bem há cuja posse não partilhada dê satisfação. […] cada um de nós ao ser útil aos outros é útil a si mesmo.

Séneca nasceu em Córdova, no ano 4 antes da nossa era, e viveu em Roma, onde morreu no ano 65 da nossa era.

Foi perceptor de Nero, de quem tentou fazer um imperador esclarecido, só o tendo conseguido durante alguns anos, acabando por ser por ele condenado à morte.


Fontes bibliográficas: Séneca, citado por Vieira (2010; p. 19); Droit (2011; pp. 197-203)
Imagem: Encyclopaedia Britannica

sábado, 1 de julho de 2017

[0053] A exuberância da «Viagem da Camélia»

Jun Shirasu (nascido no ano de 1963, em Tóquio) apresentou este ano, na Galeria Ratton (Lisboa), um conjunto de painéis de azulejos intitulados, globalmente, A Viagem da Camélia.
A Camélia, ou Japoneira, chegou à Europa vinda do Extremo Oriente.

Primeiro painel, a ler da direita para a esquerda, como na escrita japonesa:




Um navio português, com os
mastros substituídos por
uma cameleira / japoneira,
parte da baía de Nagazaqui;
em terra, representados à
semelhança dos biombos,
estão miúdos, monges,
piratas, animais,
objectos diversos













Parte outro navio português;
a sua tripulação está
representada
como nos biombos Namban


Estes painéis de Jun Shirasu foram pintados em azul cobalto sobre esmalte branco.
O azul cobalto surgiu na antiga Pérsia, tendo daí chegado à antiga China, através da rota da seda. Na China, entre os séculos XIII e XIV, o cobalto foi adoptado na decoração das porcelanas; e a influência destas na Europa levou à sua adopção no azulejo, onde se tornou predominante no século XVII.

Fonte: folheto de Meco (2017)
Fotografias: Eva Maria Blum