domingo, 15 de novembro de 2020

[0246] A caçada do rei Shapur II

A observação de um só objecto pode trazer luz sobre toda uma época. Foi essa a ideia subjacente a oito mensagens iniciadas e interrompidas há três anos, baseadas no livro Uma História do Mundo em 100 Objetos (do British Museum), de Neil MacGregor:

Uma escultura conhecida por «Renas nadadoras», com cerca de 13 mil anos, sugere que recuemos até ao tempo dos caçadores-recolectores europeus (mensagem «0036»).
Uma «Estatueta maia do deus do Milho», vinda de Cópan, na América Central, recorda-nos, apesar de ter sido esculpida no início do século VIII, um deus que era os Maias adoravam desde há milénios, como consequência da enorme transformação que a agricultura começou a introduzir, um pouco por todo o mundo, por volta de 9 mil anos antes de Cristo (mensagem «0042»).
Um outro aspecto desta transformação é-nos lembrado por uma «Tabuinha antiga escrita» há cerca de 5 mil anos (com sinais cuneiformes), encontrada no Sul do actual Iraque: nela estão registados pagamentos por serviços relacionados com … a cerveja (mensagem «0045»).
O «Papiro matemático de Rhind» é o objecto seguinte; escrito por volta de 1550 antes de Cristo, foi encontrado nas proximidades de Luxor, no Egipto, e contém vários problemas de Matemática (mensagem «0046»)
Os «Relevos de Lachish», em pedra, encontrados em Nínive, no Norte do Iraque, datam de cerca de 700 anos antes de Cristo e recordam-nos a violência guerreira exercida pelos impérios de então (mensagem «0048»)
O «Sino chinês de bronze», feito no tempo de Confúcio, mostra-nos como no século V antes de Cristo também se fazia filosofia e música (mensagem «0049»)
A «Pedro de Roseta», gravada no início do século II antes de Cristo, no Egipto, evoca-nos três histórias: a da dinastia dos Ptolomeus (terminada com Cleópatra); a da competição entre franceses e ingleses no início do século XIX; e a da decifração da escrita hieroglífica (mensagem «0052»).
Por fim, o «Pimenteiro de Hoxne», encontrado no Sul de Inglaterra, conta-nos histórias sobre as viagens da pimenta e sobre as mudanças políticas traumáticas no século IV da nossa era (mensagem «0098»).


A escolha de objectos feita por Neil MacGregor foi estruturada em vinte épocas, sendo cada uma representada por cinco objectos (daí 20 x 5 = 100 objectos).
Depois de apresentar as oito primeiras épocas, MacGregor explicou assim a seguinte: “Lutando para abarcar o infinito, um pequeno número de religiões moldaram o mundo nos últimos dois mil anos.” E os cinco objectos que selecionou para a representar estão relacionados com religiões surgidas entre 100 e 600 d.C.: o budismo, o cristianismo, o hinduísmo, o zoroastrismo e o islamismo.

Eu escolhi, como objecto, o «Prato de Shapur II»:


Trata-se de um prato de prata onde se vê o rei Shapur II a caçar.
Shapur foi um dos reis da dinastia Sassânida, no Médio Oriente, que reinou longamente, entre 309 e 379. No seu tempo os reis não dispunham apenas de poderes seculares, pois também eram agentes de deus, neste caso do zoroastrismo, a religião estatal.


Não é certo que tenha havido um Zoroastro. Mas, se existiu, terá vivido por volta de 1000 antes de Cristo nas estepes da Ásia Central, tendo sido o primeiro profeta a afirmar que o universo é um campo de batalha entre as forças do bem e as do mal e a ensinar que o tempo não é um ciclo interminável, pois terá um fim, ideias que também inspiraram outras religiões, como o cristianismo e o islamismo.


Fonte: livro de MacGregor (2014; pp. 257 e 269-273)

Sem comentários:

Enviar um comentário