sábado, 31 de agosto de 2019

[0188] Soluções e problemas trazidos pelos «nós»


Na Pré-história, a fixação das diversas partes das ferramentas de trabalho (machados, arpões) já era feita mediante ouso de nós.
Naturalmente, dada a complexificação das ferramentas, o uso dos nós aumentou durante a Antiguidade Clássica. Dessa época, houve um nó que se tornou célebre, devido à história (ou à lenda) em que se viu envolvido: o nó górdio. Conta-se que Alexandre o Grande, ao passar pela Frígia (situada na Ásia Menor) em 334 a. C., ouviu falar de um nó que ninguém conseguira desatar, sendo prognosticado que quem o conseguisse fazer dominaria o mundo. O nó atava um carro de bois a uma das colunas do templo dedicado a Zeus. E Alexandre, que o quis ver, analisou-o longamente até que, desembainhando a espada, o cortou com um golpe. A expressão cortar o nó górdio evoca esta história / lenda, aludindo a uma forma de pensar fora do usual, eventualmente devido ao poder que se detém.

Os nós de marinheiro são os mais célebres nós da actualidade, sendo usados nas embarcações e em muitas outras situações não ligadas à marinharia. Quando eles são figurados, surgem com as extremidades livres, de modo a que as cordas possam ser amarradas, por exemplo, aos mastros.

O ramo matemático a que se chama Topologia desenvolveu uma Teoria dos Nós, postulando, no entanto, que as extremidades de um nó não ficariam livres, mas sim ligadas uma à outra. A grande finalidade desta teoria é, assim, distinguir os nós uns dos outros. E, para ela, um nó é uma curva fechada do espaço tri-dimensional que não se intercepta a si própria. Esta teoria distingue dois tipos de nós, de que são dados a seguir alguns exemplos:

Nós simples (constituídos por apenas uma curva fechada):

Nó trivial              Nó em trevo              Nó em oito

Nós compostos, ou nós ligados (constituídos por duas ou mais curvas fechadas):


Apesar do método de Alexandre o Grande permitir desatar qualquer nó, o método mais tradicional continua a ser muito usado. O que, como toda a gente já experienciou, nem sempre é fácil de concretizar. Por isso, depois de o pintor alemão Johann Schmidtner ter pintado um quadro em que Nossa Senhora aparece a desatar os nós humanos, passou a ser evocável o seu apoio mediante a menção a Nossa Senhora Desatadora dos Nós:

Johann Schmidtner, 1700
(óleo sobre madeira de álamo; 182 × 110 cm;
St. Peter am Perlach, em Augsburgo)

Fontes: artigos de Adams, Furstenberg, Li e Schneider (1997; p. 640), Belaga (1997; p. 42), Budworth (1997; pp. 8-9), Neuwirth (1997; p. 56); versão portuguesa da Wikipédia (para a Nossa Senhora Desatadora de Nós) e sítio (já não acessível) do The Mathematics and Knots Exhibition Group (para as imagens dos nós)

segunda-feira, 26 de agosto de 2019

[0187] A grande separação entre plantas e animais


Nenhuma estimativa acerca da proporção entre o peso total das plantas e o peso total dos animais na Terra, actualmente, atribui menos de 80 % às plantas.

O último antepassado comum a plantas e a animais terá existido há cerca de 600 milhões de anos, numa altura em que a vida ainda só existia nas águas. Ao acontecer a separação, as plantas tenderam a fixar-se e a utilizar a energia solar, enquanto os animais se preparam para o movimento, em busca de outras energias. Isso implicou profundas diferenças nos corpos das espécies destes dois reinos da vida: segundo Stefano Mancuso, as plantas descentralizaram as suas funções por todo o corpo (a produção, a respiração, os sentidos, a reprodução, …) e os animais concentraram cada função num órgão específico.



Qualquer que seja o problema, os animais resolvem-no deslocando-se: se falta alimento, vai-se para onde ele exista; se está demasiado calor, demasiado frio, se o clima é demasiado húmido ou demasiado seco, migra-se para onde há condições mais propícias; se os competidores aumentam de número e se se tornam cada vez mais agressivos, muda-se para novos territórios; se não se encontram parceiros para a reprodução, vai-se à procura deles. (…). Os animais, portanto, não resolvem os problema, mas evitam-nos eficientemente (…).

As plantas, pelo contrário, não podem “fugir ao ambiente, apenas sobrevivem porque conseguem perceber sempre e com grande certeza uma multiplicidade de parâmetros químicos e físicos, tais como a luz, a gravidade, os elementos minerais à sua disposição, humidade, temperatura, estímulos mecânicos, estrutura do solo, composição dos gases da atmosfera, etc.” Até se apercebem de “sinais bióticos (ou seja, resultantes de outros seres vivos), tais como a proximidade ou distância de outras plantas, a identidade destas e a presença de predadores, simbiontes ou patogénicos (…).
As raízes são o seu órgão mais importante. Elas exploram os solos onde se encontram, captando gradientes muito débeis de oxigénio, água, temperatura, substâncias nutrientes. Já foram contados, num único centímetro cúbico de solo florestal, mais de mil ápices radiculares; se a árvore for adulta, poderá dispor de milhares de milhões.

Fonte: livro de Mancuso (2019; pp. 101-108)

sábado, 10 de agosto de 2019

[0186] Os passos de gigante que os pés de barro dão


Um pequeno passo para o homem, um passo de gigante para a humanidade”, afirmou Neil Armstrong (1930 – 2012), o primeiro astronauta a pisar o solo lunar, em Julho de 1969.

Agora que se completaram 50 anos sobre a primeira alunagem, e sendo conhecido o crescente envolvimento dos interesses privados na exploração espacial, importa perguntar se o «passo de gigante» que se pretendeu ter sido dado pela «humanidade» não reclamará provas de uma muito maior capacidade de tratar o planeta que habitamos, para que haja garantias de respeito por qualquer outro planeta onde pretendamos viver:

Cartoon de Cristina Sampaio

Fonte: cartoon de Sampaio (2019)


sábado, 3 de agosto de 2019

[0185] Da «Victoria amazónica» ao «Crystal Palace»


A Grande Exposição Internacional de 1851 foi realizada em Londres, tendo para tal sido construído no Hyde Park um enorme edifício, em ferro fundido e vidro, a que revista satírica Punch chamou The Crystal Palace (O Palácio de Cristal):


Com 564 metros de comprimento, 124 metros de largura e uma altura que atingia os 39 metros, disponibilizou 92 mil metros quadrados para os 14 mil expositores que vieram de todo o mundo, alguns deles para mostrar as últimas novidades da Revolução Industrial:


Algum tempo após a exposição, em 1854, este enorme edifício foi desmanchado e remontado, com ampliações, noutra zona da cidade, tendo aí permanecido, aberto a visitas, até ser destruído por um incêndio em 1936.

O que aconteceu antes do início da construção deste edifício pode ter sido, no entanto, o mais interessante.
A comissão que deveria escolher o projecto a implementar recusou os 245 que lhe foram apresentados e os quatro especialistas que a seguir foram nomeados para encontrar rapidamente uma solução não o conseguiram fazer.
Joseph Paxton (1803-1865), jardineiro em Chatsworth House, e que aí tinha experimentado o uso do vidro e do ferro na construção de grandes estufas e percebido as vantagens da sua simplicidade, força e duração, defendeu a construção por módulos (um quadrado com cerca de 7,5 metros de lado), que poderiam ser produzidos em série, e a sua ideia, transformada em projecto pelo engenheiro William Cubitt, foi aceite. Com 2 mil trabalhadores em permanência no Hyde Park, foi possível proceder à montagem do edifício original em apenas seis meses.
Paxton inspirara-se nas suas observações botânicas: para o edifício, como as plantas crescem através do acrescento de novos módulos; e, para as abóbadas, como as nervuras da Victoria amazonica se estruturam radialmente:


Fontes: livro de Mancuso (2019; pp. 135-140); sítios da Wikipédia