Deve ter sido em 1959-60, ou em 1960-61, que ouvi numa aula
de Português o professor Vergílio Ferreira (1916 - 1996) dizer à minha
turma: há actualmente condições para que venha a
acontecer um novo Renascimento.
Eu e os meus colegas já tínhamos uma ideia, vinda das aulas
de História, sobre o que fora o primeiro
Renascimento, pelo que o anúncio de que um segundo
era possível significou (para pelo menos alguns de nós) uma chamada de atenção
para as mudanças em que as sociedades permanentemente estão envolvidas: e esta,
se acontecesse, seria particularmente interessante. Um miúdo com cerca de 14
anos não o esquece.
Segundo este novo anúncio
sobre o futuro, ou tão só desejo que
ele aconteça, não estaríamos na eminência de um Renascimento, mas sim
necessitados de uma Filosofia que desempenhasse o papel que já desempenhou em
dois outros surtos de criatividade a que a “civilização
ocidental” assistiu, tendo cada um deles durado cerca de 150 anos, e que
ocorreram, citando Anthony Gottlieb, “O primeiro na Atenas de Sócrates, Platão
e Aristóteles, de meados do século V até finais do século IV a.C.. O segundo
foi no Norte da Europa, no seguimento das guerras de religião e da ascensão da
ciência de Galileu. Estendeu-se desde a década de 1630 até às vésperas da Revolução
Francesa, no final do século XVIII. Nesse período de tempo relativamente curto,
Descartes, Hobbes, Espinosa, Locke, Leibniz, Hume, Rousseau e Voltaire - isto
é, a maioria dos filósofos modernos mais conhecidos – deixaram a sua marca.”
Para Wilson, serão os “cientistas
e os estudiosos das humanidades” que fundamentarão esta “nova filosofia”, de que “resultará
o Terceiro Iluminismo. Ao contrário dos primeiros dois, este pode perdurar. Se isso
acontecer, aproximará a nossa espécie da oração pela razão inscrita por
Diógenes, e ainda visível na sua forma original no Pórtico de Oinoanda, na
antiga região grega da Lícia.
Em
especial aqueles que são chamados estrangeiros, e que na realidade não são
estrangeiros. Porque, apesar de as várias regiões da Terra atribuírem a pessoas
diferentes um país diferente, em toda a parte as pessoas têm um único país – a Terra
inteira – e uma só casa – o mundo.”
A preocupação subjacente a este augúrio de Wilson, tal como
ao do meu saudoso professor, é a mesma. Mas eu prefiro claramente a de Vergílio
Ferreira, talvez porque a imagino mais aberta à participação de todos, e menos baseada
na Ciência, que proporciona «conhecimento», mas não «valores» (que só os
colectivos de cidadãos podem definir).
Fonte: livro
de Wilson (2018; pp. 191-194)
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