Para exemplificar o que distingue a «táctica» da «estratégia»
podemos observar o que se passa no Jogo do Galo.
O Jogo do Galo
é o parente mais simples de três outros jogos de alinhamento já referidos
noutras mensagens, o Quatro em Linha (mensagem «265»), o Cinco em Linha
(mensagem «4») e o Jogo do Moinho (mensagens «55», «296» e «315»).
Nos jogos de reflexão a táctica pode ser definida como o cálculo exacto de
um pequeno número de lances; baseia-se, portanto, na lógica, e equivale, na Matemática,
a uma demonstração. Já a estratégia não é exacta, tendo no entanto a
vantagem de olhar para o médio e longo prazo; ela equivale a uma heurística
(ver a mensagem «265»), um procedimento que se baseia na experiência e que não
tem equivalente na Matemática formal.
Quem já jogou um bom número de vezes ao Jogo do Galo sabe que o único resultado
razoável que há a esperar é o empate. Mas também sabe que há neste jogo algumas
distrações que podem ser fatais. Por isso, o jogador experiente, e que não
gosta de perder, costuma ter uma estratégia
Admitamos, meramente como exemplo, que a estratégia do primeiro jogador é: «jogar
de modo a maximizar o potencial das peças que já jogou». E admitamos ainda que
o segundo jogador escolhe os seus lances sem grande cuidado.
Ora, neste jogo, existem 8 alinhamentos de peças que ganham: cada uma das 3
linhas verticais, cada uma das 3 linhas horizontais e cada uma das 2 diagonais.
E há três possibilidades de colocar a primeira peça no tabuleiro: ou num dos
seus 4 vértices, ou no meio de um dos seus 4 lados, ou no seu centro.
Que decisão deve então tomar o primeiro jogador para seu lance inicial? Se
jogar num vértice, dispõe de 3 alinhamentos ganhantes (um horizontal, um
vertical e um diagonal); se jogar a meio de um dos lados apenas dispõe de 2 (um
vertical e outro horizontal); e se jogar no centro do tabuleiro dispõe de 4 (um
vertical, um horizontal e as duas diagonais. Joga, então, no centro do
tabuleiro (a marca X no diagrama seguinte): ele não fez nenhum
cálculo, apenas aplicou uma «estratégia» que achou ser prometedora e que já
terá sido por ele experimentado, com sucesso, noutras ocasiões.
Como mínimo, ao jogar assim, o primeiro jogador já impediu que o segundo utilize
com êxito 4 dos 8 alinhamentos ganhantes!
Face a este lance, o segundo jogador, que não pensa estrategicamente, tem duas
possibilidades distintas, ou jogar num dos 4 vértices, ou jogar no meio de um
dos 4 lados (marcas O no diagrama):
Em ambos os casos, restam ao primeiro jogador 3 alinhamentos
ganhantes com a sua única peça (no primeiro caso, um vertical e dois diagonais;
e, no segundo, um vertical, um horizontal e um diagonal).
Mas no primeiro caso ele pode calcular rigorosamente o que vai seguir-se: se
jogar numa das três casas de cima, ou numa das três de baixo, ele tem a certeza
de ganhar: apenas não tem a certeza de o conseguir se jogar na casa situada a
meio do lado esquerdo. Dispõe, agora, de um lance táctico.
O próximo diagrama mostra o que acontece depois de o primeiro jogador jogar num
dos vértices e de o segundo jogador apenas jogar para não perder de imediato:
Agora o segundo jogador não pode responder a duas ameaças
de ganho do primeiro jogador e este ganhará com o seu quarto lance.
O leitor desta mensagem pode imaginar o que acontecerá se o segundo lance do
primeiro jogador for outro.
E que acontecerá se o segundo jogador tiver escolhido uma das casas de vértice
para seu primeiro lance?
Pensando de acordo com a sua estratégia, o primeiro jogador apenas deve recusar
jogar na diagonal onde já se encontram uma peça de cada jogador, pois essa
diagonal já não é ganhante para nenhum deles; qualquer outro lance do primeiro
jogador alinha duas suas peças, estando a terceira casa ainda por preencher. O
diagrama seguinte mostra o que sucede após um desses lances (ambos os
jogadores, estando atentos, vêem-se obrigados a impedir que o outro coloque uma
terceira peça alinhada):
É claro que o segundo jogador impede também esta última
tentativa de alinhamento do primeiro jogador, terminando o jogo com um empate.
Se o segundo jogador usasse a estratégia do primeiro, nunca efectuaria o
primeiro lance a meio de um lado do tabuleiro, casa que só lhe permite um
alinhamento, mas sim num vértice, pois aí a peça jogada dispõe de dois
alinhamentos potenciais.
Se os dois jogadores optassem por seguir esta estratégia, empatariam sempre!
E se o primeiro jogador decidisse jogar o seu segundo lance fora da sua
estratégia, ou seja, alinhando três peças (duas dele e uma do adversário) na
mesma diagonal?
Há também quem chame táctico a este
lance, não lógico. É que o segundo jogador dispõe agora de dois maus lances (a
meio de um lado) e de apenas um bom lance (num dos vértices), pelo que o seu
modo descuidado de jogar o coloca em risco. O último diagrama mostra o que lhe
sucede após uma das más escolhas:
E agora o segundo jogador não pode responder a duas ameaças de ganho do primeiro.
O leitor pode imaginar o que acontecerá se o segundo lance do segundo jogador
for outro.
Nem sempre jogar com estratégia é o
melhor lance …
A Lógica (e a Matemática) não explica(m) tudo nos Jogos de Reflexão.